Tuesday, November 15, 2011

Eu sonhei que estava em Recife

Eu sonhei que estava no Recife Antigo, na década de 80, às tantas da madrugada. Parava na esquina, puxava um Hollywood do bolso e acendia. Depois de soltar uma baforada, ficava pensando: por aqui já passou muita gente que já morreu.
Ali, antigamente, tinha um bocado de cabaré. Era bom demais. Rua da Moeda, Vigário Tenório, Torre Malakoff... O Oceano Atlântico ficava ali na frente, ventilando, cheiroso, fazendo uma zoadinha. Tinha o Tonny Drink’s, o Capitólio, Night and Day... As meninas eram esguias, vestidinho curtinho, tamanquinho e rabo de cavalo. A boite estava aromática, ervas pelo chão, uma bola prateada girando à luz negra. A gente pagava 5 mil réis e tinha direito a uma dose de Ron Montilla com um limão escanchado na beira do copo. Recebia, também, um saco de pipoca milho em flor. Aí, veio uma camarada branquinha, sentou-se ao meu lado, apoiou o queixo sobre as mãos enclavinhadas e perguntou: - Tudo bem?
E eu, todo amostrado: Melhorou muito!
Pegou na minha mão, deu um cheiro na minha bochecha e me tirou pra dançar. A gente dançava solto, uns ritmos quentes, americanos. Quando ela ria, o rosto ficava todo iluminado, parecia que eu estava sonhando. Eu era maneiro, o sangue desintoxicado, todo novo. Nunca me esqueço desse sonho que já sonhei tantas vezes. Nunca me esqueço de que, quando fomos dormir, ela escovou os dentes. É a vida. Nem tudo a gente pode contar. O sexo ficou para a cama, e os segredos do amor, para o coração.
Onírico abraço!
Sosígenes Bittencourt

9 comments:

Manoel Carlos said...

ótimo, ótimo e ótimo.

Anonymous said...

Parabéns pelo sonho e pelas situações sonhadas no mesmo. Que de tão bem contado, até parece algo vivenciado na realidade. Creio que quando passamos por boas experiencias de vida em nossas vidas; seja pessoas, lugares, momentos, acontecimentos... Dificilmente essas lembranças deixarão as nossas memórias. E nos sonhos é como se fosse uma forma de revivê-las. Sonhado nostálgico abraço.

Sosígenes Bittencourt said...

Por isso, não seria bom afirmar que tempo é dinheiro. Tempo é o tecido de nossas vidas. A matéria prima de nossa arte é o passado. Eterno é o passado, pela impossibilidade de mudá-lo.
Inspirado abraço!

Anonymous said...

Ah, Recife antigo

Palco de tantas lembranças para todas as gerações.

Que sonho tão inspirador para todos nós.

Excitante abraço.

Aninha Marques

Sosígenes Bittencourt said...

Quando vou ao Recife, fico procurando fragmentos do Recife que sobreviveu ao concreto da expansão urbana. Aqui e acolá, uma árvore centenária, uma arquitetura antiga, um aroma de flores.
Lembra-me o poeta Mauro Mota: "Quem morre, em Recife, engana a morte."
Aninha(do) abraço!

Roberto Vasconcelos said...

Ao entrar nesse Blog, a gente se sente um pouco orgulhoso de ser vitoriense. Um informativo sempre atualizado, com muito humor e de muito bom gosto, sofisticado até, sem contudo perder a simplicidade.
Vida longa ao nosso mais competente "blogueiro".

Roberto Vasconcelos said...

Ao entrar nesse Blog, a gente se sente um pouco orgulhoso de ser vitoriense. Um informativo sempre atualizado, com muito humor e de muito bom gosto, sofisticado até, sem contudo perder a simplicidade.
Vida longa ao nosso mais competente "blogueiro".

Anonymous said...

Amigo Sosígenes, agora descobri por onde andas !!! Precisamos conversar.
Abraços... Fernando

Sosígenes Bittencourt said...

Eu aprendi mais no cabaré do que pude ensinar no cabaré. Minha vida é uma aula em dois sentidos, naquilo que aprendo e naquilo que ensino. Aprender é estudar a vida, é leitura do que se vive. Mulher da vida é uma expressão que resume o quanto alegra e o quanto dói a vida.
Boêmio abraço!