Um dia, eu estava conversando lorota numa roda de
mulheres faladeiras quando uma delas se saiu com uma conversa meio fútil, mas
interessante ao mesmo tempo. É que eu perguntei por uma menina que conheci,
meio namoradeira, moradora do bairro, e a língua de trapo pegou um ar
desgraçado. A mulher virou-se numa chibata moral.
Disse que morou vizinha à família da escrachada; que
o pai dela tinha uma venda de esquina, dessas de balcão de madeira, que vendia,
de caramelo a candeeiro, de aguardente de cabeça a remédio pra dor de barriga, e
falava mais do que o homem da cobra.
O defeito do pai da camarada é que batia com o nó
dos dedos no balcão da venda e dizia que o dinheiro que tinha, nem Deus
acabava. Ora, pelo que a linguaruda sabia, Deus tira a vida do homem, que dirá
sua mercadoria. E largava o pau no condenado.
A gente se afastava da faladeira, porque, de tão
entusiasmada, saltando de um pé só, uma veia pulada no pescoço, gritava e
cuspia que nem uma doida.
Bem... para encurtar a conversa, contou que, de
“repentemente”, foram surgindo mercadinhos por todo canto, como se fosse uma
praga divina.
Os mercadinhos tinham preço, sortimento na moda, o
cliente pegava nas compras com a mão, revirava, cheirava, apalpava e levava
numa cestinha para pagar no caixa. Ninguém perdia tempo nem tinha conversa mole:
- Muito obrigado, tenha um bom dia!
Quando se perguntava na rua: - Tu ainda estás
comprando na venda de seu Fulano? - o interrogado respondia: - Deus me defenda!
Daí, o dono da venda quebrou, a filharada se
dispersou, e me sobrou a menina que a faladeira só não a chamou de santa,
porque Deus é Pai. Eu namorei com ela, comprei leite de vaca para o menino
dela, mas nunca a vi tão avacalhada nem tanto adjetivo ruim como os que aquela
marocas lhe imputou. Tem jeito?
Linguarudo abraço!
Sosígenes Bittencourt