Friday, August 05, 2011

Histórias pra contar

Amanheço o dia ouvindo histórias de minha mãe. Não faz nada, não faz nada, faz 56 anos. Hoje, me contou que sonhou com um cachorro mordendo sua mão. Ela estava numa calçada, numa determinada rua, no tempo em que era menina. Porém, a bolsa que carregava era uma bolsa que está ainda agora lá no seu quarto. Ora, isso é o tecido de sua história, de sua vida, do seu tempo. Pena que esteja envolvida no stress do dia a dia de um tempo de aceleração. Aceleração que não nos permite pensar naquilo que fazemos e preservar a imagem, a lembrança daquilo que fazemos para podermos mostrar a peça de nossa existência no futuro.

Lembro-me de uma história que ela conta do tempo em que era criança. Minha mãe morou numa rua onde passava enterro. Não passava enterro todo dia, porque não havia tanto mortal que desse para produzir um defunto a cada 24 horas. Mas, sentadinha na calçada, ou debruçada na janela, tirava o dedinho da boca e dizia, inocentemente, em tom de lamúria: - Passa o enterro de todo mundo, só não passa o de mãe. Essa lembrança deve ter o quê? Uns para lá de 70 anos.

A psicanalista Rita Maria Kehl diz, em uma palestra sobre "Aceleração e Depressão", que nós vivemos num mundo onde a resposta instantânea à multiplicidade de estímulos está nos tirando a possibilidade de enredar a teia de nossa existência, confeccioná-la. Estamos ficando sem passado e perdendo, por isso, uma perspectiva de futuro. Estamos sem consistência, o que nos afunda num vazio imenso, que gera desânimo, falta de alegria, desinteresse e depressão. Isso é de morte!

Desanimado abraço!
Sosígenes Bittencourt

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