Friday, December 06, 2013

Anoiteceres

Anoitece em Vitória. Anoiteço em Vitória.
Sou figura noturnal, viajante do ocaso,
sonhador como o crepúsculo vespertino,
morto de saudade como o final.
De olhos vendados, conheço o cheiro dos bairros,
dos becos, do meio do mato de minha cidade natal.
O cheiro de fumaça, de mingau, de chuva.
Sou todo olfato e lembrança. Conheço os trejeitos do meu lugar,
os cabelos perfumados, os enxerimentos, o flerte e o gozo.
Minha cidade é todinha uma mulher.
Chamar-se-ia Vitória das Marias, Maria das Vitórias, tal como é.
Anoitece em Vitória. Anoiteço em Vitória.
Saio para passear, impregnado dos prazeres noturnos,
das eras do meu tempo, que me viciam e me saciam.
Minha cidade muda todo dia, mas não muda o meu sentimento,
o fascínio elaborado pela memória,
como quem ama o que odeia e odeia o que ama,
num jogo de perde e ganha.
Anoitece em Vitória. Sobretudo, anoiteço em Vitória.
Enlouqueço em Vitória. Porque ninguém entende o que em nós
nem conseguimos explicar.
Vitória, meu berço e minha tumba.
Minha alma noctívaga vai enredando sua história.
O acaso me espreita, a surpresa me seduz,
sua bruma, sua luz.
Alucinações e desejos, rimas em ‘ina’, adrenalina,
serotonina, dopamina.
Ah! Vitória, dos meus idos e vindas de menino, minha menina!

Sosígenes Bittencourt

2 comments:

Sosígenes Bittencourt said...

Acredito que muitas almas sentem seu lugar como eu, mas só quem tem coragem de fuxicar suas inspirações é aquele a quem chamam de poeta.

Sosígenes Bittencourt said...

Quando a poesia passa na frente do poeta, o resultado é poesia. Eu sou um fuxiqueiro do Belo.