Sempre que alguém tira algo de mim e atira no lixo, penso na morte. Por exemplo, cortar cabelo e extrair dente me levam a pensar na "Indesejada das Gentes", como diria Manuel Bandeira, o poeta da Rua da União. Ainda bem que não ando com medo de morrer, nem sofro de hipocondria, embora nunca entenda por que nascemos para morrer. Semana passada, mandei cortar o cabelo, pensei na morte. Ontem, mandei extrair um dente, pensei na morte. Costumo dizer que medo de morrer, da minha idade, é covardia. Principalmente, quando se mora num país onde a violência nos espreita em cada esquina. Quando vejo meus cabelos sendo atirados no chão para nunca mais voltar, ou um dente removido, imprensado num alicate, sinto uma sensação de que passaram-se os anos, de que algo de mim estaria sendo sepultado, como numa prévia do momento derradeiro. Contudo, consolo-me em saber que é melhor para a vida remover o que poderia lhe causar a morte. Já não basta a degradação ambiental, o efeito estufa, o degelo das calotas polares e o Buraco da Camada de Ozônio.
Ao barbeiro e dentista que me despoluíram, meu cordial abraço!
Sosígenes Bittencourt
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