Thursday, April 14, 2016

ANOITECERES

ANOITECERES

Anoitece em Vitória. Anoiteço em Vitória.
Sou figura noturnal, viajante do ocaso,
sonhador como o crepúsculo vespertino,
morto de saudade como o final.
De olhos vendados, conheço o cheiro dos bairros,
dos becos, do meio do mato de minha cidade natal.
O cheiro de fumaça, de chuva, de mingau.
Sou todo olfato e lembrança. Conheço os trejeitos do meu lugar,
os cabelos perfumados, os enxerimentos, o flerte e o gozo.
Minha cidade é todinha uma mulher.
Chamar-se-ia Vitória das Marias, Maria das Vitórias, tal como é.

Anoitece em Vitória. Anoiteço em Vitória.
Saio para passear, impregnado dos prazeres noturnos,
das eras do meu tempo, que me viciam e me saciam.
Minha cidade muda todo dia, mas não muda o meu sentimento,
o fascínio elaborado pela memória,
como quem ama o que odeia e odeia o que ama,
num jogo de perde e ganha.

Anoitece em Vitória. Sobretudo, anoiteço em Vitória.
Enlouqueço em Vitória. Porque ninguém entende o que em nós
nem conseguimos explicar.
Vitória, meu berço e minha tumba.
Minha alma noctívaga vai enredando sua história.
O acaso me espreita, a surpresa me seduz,
sua bruma, sua luz.
Alucinações e desejos, rimas em ‘ina’,
adrenalina, serotonina, dopamina.
Ah! Vitória, dos meus idos e vindas de menino, minha menina!


Sosígenes Bittencourt

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